Comissão do Senado aprova relatório sobre cannabis medicinal e texto vira Projeto de Lei

Proposta seguirá agora para mesa diretora da Casa, quando se tornará um Projeto de Lei e passará a tramitar nas comissões

Publicada em 26/09/2019

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A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal aprovou, na manhã desta quinta-feira (26), o relatório favorável à sugestão legislativa (SUG 06/2016) que regulamenta a cannabis medicinal e cânhamo industrial no Brasil. O texto seguirá agora para mesa diretora, quando se tornará um Projeto de Lei e passará a tramitar na Casa.

A SUG propõe normas procedimentais e regulamentares extremamente detalhadas sobre como se dará a pesquisa, a produção, o registro, a rotulagem, a padronização dos produtos, a certificação, o licenciamento, a comercialização, a circulação, a tributação, a publicidade, a inspeção, o controle e a fiscalização da maconha medicinal e do cânhamo industrial.

Com receio de que o relatório não fosse aprovado, o relator Alessandro Vieira (Cidadania-SE) chegou a pedir retirada do texto de pauta para garantir aprovação na quinta-feira seguinte. Contudo, seus colegas fizeram um apelo para votá-lo nessa manhã. Caso contrário, seria a terceira vez seguida que a votação matéria seria adiada na comissão.

No fim, o texto foi aprovado com apenas um único parlamentar contrário, Eduardo Girão (Podemos-CE), que apresentou um voto em separado. Os demais senadores presentes, que aprovaram a sugestão, foram:

  • Alessandro Vieira (relator)
  • Arolde de Oliveira
  • Chico Rodrigues
  • Fabiano Contarato (REDE-ES)
  • Flávio Arns
  • Leila Barros
  • Mara Gabrilli (PSDB-SP)
  • Nelsinho Trad
  • Paulo Paim
  • Paulo Rocha
  • Romário
  • Telmário Mota
  • Zenaide Maia

Ao virar Projeto de Lei, o texto começa a tramitar nas comissões. Em princípio, não volta mais para a CDH. O mais provável é que o PL vá para as comissões de Assuntos Sociais e Constituição e Justiça antes de ir a plenário.

Assista à sessão na íntegra

O debate sobre a cannabis medicinal inicia a partir de 53:50

https://www.youtube.com/watch?v=yR3E6Q4H5Yk

Como foram as discussões

Fabiano Contarato chamou de "covardia" uma eventual retirada do texto de pauta e fez um discurso forte para os senadores não adiarem mais a proposta. Sustentou que seria uma violação ao principal "bem jurídico garantido pelo estado que é a vida humana":

"O que mais me envergonha é que não estamos sequer, isso é uma sugestão, não é sequer projeto de lei, nós não estamos sequer autorizando apresentar um projeto de lei. Isso é covardia, estou assustado com o que o País está passando".

Mara Gabrilli, tetraplégica e usuária de cannabis medicinal, fez um discurso emocionante na comissão em defesa da medicação.

"Por que o Brasil tem que ir na contramão, se 40 países já decidiram legalizar a cannabis medicinal? Por que a dor das pessoas de outros países é mais importante que a dos brasileiros?", questionou.

A senadora também ressaltou a importância do THC medicinal. Disse que o CBD isolado não funciona para a sua doença e que se não fosse a substância psicoativa, ela não estaria viva, e ainda ironizou: "alguém já viu eu alucinando no Congresso". Gabrilli também criticou a falta de acesso dos brasileiros à medicação:

"O remédio que eu tomo custa R$ 3 mil. Uma espirradinha do remédio é R$ 15. É pesado pra eu bancar que sou uma senadora da república, imagina pro resto da população brasileira".

Girão foi o único senador a criticar a proposta. Mesmo com o relato de Mara Gabrilli, o político não reconheceu os efeitos terapêuticos do THC:

"A gente precisa ter muita responsabilidade, porque ao mesmo tempo que o THC consegue ter uma ação positiva em você, nós temos relatos de outras dezenas de famílias que o THC fez mal, que o THC produziu problemas maiores".

O parlamentar alegou ainda que "o discurso que promove a maconha medicinal não se sustenta, pois não existem estudos conclusivos para comprovar que o estudo da cannabis, nas suas diversas formas, óleo, fumada, inalada, venha proporcionar efeitos medicinais definitivos".

Argumentou ainda que o plantio de maconha no Brasil pode trazer "graves implicações ambientais". Disse que são plantas que consomem água e energia de forma excessiva e que provocariam a "liberação de dióxido de carbono na atmosfera, são alarmantes os impactos na fauna e flora".

Telmário Mota (PROS-PR), apelou para o emocional para convencer o colega a não pedir vistas e adiar ainda mais a votação:

"Eu já vi o senador Girão chorar, ele é humano, eu conheço o coração dele. Tenho certeza que ele não vai paralisar hoje porque ainda é uma proposta, tem diversos lugares para discutir. Tenho certeza absoluta que Senador girão não vai deixar essas dezenas de pessoas sair daqui decepcionadas".

Funcionou. O senador não pediu vistas, mas votou contrário e o texto avançou. A aprovação da proposta foi comemorada por pacientes e familiares que acompanharam a sessão, em Brasília.

Senadores convencem Eduardo Girão a não pedir vistas e votar proposta na sessão desta quinta-feira (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

Objetivos originais da proposta

A sugestão original para o projeto de lei em favor da maconha medicinal e do cânhamo industrial apresentada pela Rede Brasileira de Redução de Danos e DDHH no Senado lista os seguintes objetivos:

I – Estabelecer um marco regulatório abrangente relativo à maconha medicinal, em conformidade com o Decreto 5813/2006, que aprova a Polícia Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, do Ministério da Saúde.

II – Garantir a emissão de licenças de cultivo e manipulação de cânhamo industrial, e de autorizações de produção de sementes de cânhamo agrícola pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. (Leia a íntegra do documento)

O senador Alessandro Vieira, no entanto, é contra a proposta de autocultivo:

“O que nós estamos avançando com a Anvisa é no sentido de regulamentar o cultivo e o fornecimento desses produtos pelo próprio estado, vedando o autocultivo que pode realmente gerar o risco de consumo recreativo. Sem dúvida tem que regulamentar, fiscalizar, evitar que ocorra qualquer tipo de desvio que vá ser vinculado a consumo recreativo. Nós defendemos é atender uma necessidade médica”.