Resgate às raizes

O surf, sinceramente, eu considero mais que um esporte, mas um estilo de vida, e se assemelha muito à cannabis

Publicado em 04/02/2024
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Quem me conhece sabe que uma das minhas paixões é o surf. Recentemente, fui conferir como será a temporada da liga mundial e me deparei com uma surpresa. Duas das melhores atletas, a americana Carissa Moore e a australiana Stephanie Gilmore, penta e octacampeã mundiais respectivamente, decidiram não competir esse ano. Sabem qual foi a razão? Querer voltar a surfar por prazer, reviver o surf de alma.  

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Jimmy Fardin é médico e apaixonado pelo surf | Foto: Arquivo pessoal

 

Essa notícia me fez refletir sobre o que sempre falo nas minhas palestras. O esporte de alta performance hoje, foca no resultado e não na saúde do atleta. A pressão do patrocinador, o interesse de uma marca ou empresa, ultrapassam o espírito esportivo. Os atletas se tornam mais competitivos, se sentem obrigados a performar extraordinariamente e vão além muitas vezes do seu limite para poder ficar no topo, conseguir o patrocínio e a glória de ser campeão.  

Uma enquete foi feita certa vez perguntado a atletas de ponta se eles tomariam uma pílula que imediatamente os fariam campeões, porém, no dia seguinte os matariam. A resposta? Cerca de 80% deles aceitariam tomar.  

Isso reflete o quanto muitos já estão longe do espírito esportivo. Óbvio que todos almejam o pódio, ou o ápice da sua modalidade, entretanto, alguns chegam a arriscar suas próprias vidas, seja exagerando nos treinos ou utilizando substâncias que melhoram suas performances, para trilhar um caminho mais cedo para a "chegada".   

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Já vimos alguns atletas desistirem de competições no auge de suas carreiras para cuidar da saúde mental, como a ginasta Simone Biles e o surfista Gabriel Medina. O surf, sinceramente, eu considero mais que um esporte ou um estilo de vida se assemelhando muito à planta da cannabis, que sempre foi livre, utilizada de maneira sábia para promover a saúde e presente na primeira farmacopeia do mundo desde 2000 a.C. Todavia, foi vítima de preconceito assim como o esporte. 

A cannabis foi além por interesses de brancos, héteros e ricos. Foi desvirtuada de seu uso, demonizada e proibida. Ambos necessitam resgatar suas raízes.  Algumas organizações como UFC, NFL, NBA estão revendo os critérios de doping referente ao uso dos canabinoides e, pasmem, muito do seu uso pelos atletas é exatamente para aliviar a pressão/ansiedade, ter uma melhor noite de sono e recuperação muscular devido a treinamento intenso que, muitas das vezes, vão além do que seu corpo aguenta. 

A grande questão, tanto em relação ao esporte quanto ao uso da terapia canabinoide, é a dosagem. Hoje, vivemos em um mundo cada vez sem mais sem limites. Invasão de nossas vidas por rede sociais, uso excessivo de telas, vícios em substâncias e práticas exageradas. Poucos de nós buscamos o autoconhecimento, se expressar, dizer o que está sentindo e ter a coragem que essas duas moças tiveram.  

Imagem do colunista Jimmy Fardin
Jimmy Fardin

Jimmy Fardin é médico ortopedista e traumatologista, com especialidade em cirurgia do joelho e artroscopia, especialista em medicina do esporte, e medicina canábica. Já participou de Olimpíadas e Paralimpíadas como médico. Experiente no tratamento de dor crônica, lombalgia, tendinites, artrose, doenças degenerativas. “Meu objetivo é cuidar de você como ser humano, não só sua patologia”