Os remédios normais não amenizam pressão

Em mais uma coluna para o Sechat, Fabrício Paplona quer saber: "Será que a Cannabis pode ser uma alternativa para redução de pressão arterial em indivíduos idosos" ?

Publicada em 28/09/2021

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Por Fabrício Pamplona

Era pra ser somente uma menção ao relaxamento que a Cannabis pode causar, aliviando um pouco da pressão que a gente sente sobre as costas. Mas essa metáfora, cantada pelo Marcelo Falcão na música "A feira" tem um fundo de verdade.

Um estudo recente publicado no International Journal of Internal Medicine por um grupo de Israel demonstrou que a Cannabis pode ser uma saída interessante para o alívio dos sintomas de hipertensão, particularmente em indivíduos idosos.

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Interessante que os efeitos cardiovasculares costumam ser uma espécie de calcanhar de Aquiles do tratamento com canabinoides, visto que o THC é visto como uma substância que provoca taquicardia (a aceleração dos batimentos cardíacos), provavelmente associada à ocorrência de ansiedade.

Neste novo capítulo, descobrimos que idosos que tiveram acesso à Cannabis tiveram um alívio na pressão arterial, reduzindo um pouco o padrão hipertensivo. É um estudo pequeno, exploratório com apenas 26 indivíduos e que não permite chegar a grandes conclusões, afinal os tratamentos foram os mais diversos possíveis: teve óleo, teve inalação e com composições que embora sejam conhecidas, continham níveis diferentes de canabinoides entre elas. 

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Trecho da música "A feira", da icônica banda O Rappa 

"Tô vendendo ervas

Que curam, me acalmam

Tô vendendo ervas

Que aliviam, me temperam

(...)

Porque os remédios normais

Nem sempre amenizam a pressão"

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Confira a música completa

https://www.youtube.com/watch?v=GmaFGnUnM1U
O Rappa - A Feira (1996)

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De maneira geral, o grupo pode ser descrito como indivíduos idosos (média de 70 anos) que faziam uso de óleo de Cannabis (mais de 80%) contendo pelo menos 5% de THC (mais de 80%). Apenas 10 indivíduos usaram composições contendo THC em maior nível do que CBD. A frequência de uso diário foi dividida igualmente entre os grupos, ⅓ usando apenas 1x/dia, ⅓ usando 2 2x/dia e ⅓ usando 3x/dia ou mais. 

Ao final do tratamento, uma grande parcela dos indivíduos relatou melhora na sua condição clínica subjacente (mais de 90%) e a pressão arterial reduziu em média 5 pontos, sem impacto na frequência cardíaca, ocorrência de arritmia ou qualquer outra alteração cardiovascular. 

Interessante notar que estudos anteriores, inclusive melhor controlados, já haviam concluído que a Cannabis ou não causava nenhum efeito ou poderia inclusive aumentar a pressão arterial. Mas nenhum deles havia demonstrado até então uma redução na pressão arterial. E agora?

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Uma das questões defendidas pelos autores é que os estudos anteriores focaram nos efeitos de curto prazo (uso agudo) e em indivíduos jovens, enquanto esse foi focado no tratamento de longo prazo, na maioria dos casos por via oral, e em indivíduos idosos. 

Me parece um pouco aquela questão de comparar uma literatura científica toda construída sobre casos típicos de usuários para entender o efeito da droga (estudos antigos) em contraponto à atual tentativa de tentar entender os efeitos terapêuticos em pacientes.

Vale dizer que 5 indivíduos resolveram abandonar o estudo por efeitos adversos como náuseas, redução de apetite, sonolência, tontura, ansiedade, dor de cabeça ou "pensamentos estranhos". Ou seja, nossos velhos conhecidos, e que realmente afetam uma parcela da população.

Será que a Cannabis pode ser uma alternativa para redução de pressão arterial em indivíduos idosos? Talvez nos casos refratários, não sei se justificaria o uso em contexto terapêutico normal frente às demais opções. Talvez faça mais sentido se a hipertensão seja decorrente de stress ou ansiedade.

Por hora, tenho certeza que esse artigo me fez curar um pouquinho de saudade, porque lembrei do Rappa. Opa, acho que isso, também, só funciona em quem tá ficando velho. 

*Fabrício Pamplona é doutor em Psicofarmacologia, cofundador da Proprium Health, Technology and Science e do Instituto Phaneros e colunista do Sechat

As opiniões veiculadas nas colunas são pessoais e de responsabilidade dos autores.

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